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A banalização das punições por doping

Posted Posted by Martinho in Artigos     Comments No comments
dez
26

Artigo originalmente publicado no Jornal Extra, em Dezembro de 2007. Edição Eletrônica. Blog de Gilmar Ferreira. Galeria de Notáveis.

A recente condenação de Romário a 120 dias de suspensão por uso da substância “finasterida”, coloca em xeque as punições por doping no Brasil e no mundo, merecendo uma profunda reflexão a respeito.

O aumento dos casos de condenação de atletas sob esse fundamento deve-se primordialmente ao fato de ter sido criada a WADA – World Anti-Doping Agency- (Agencia Mundial Anti-Doping), que, a partir de 2003, passou a divulgar anualmente uma lista de substâncias proibidas, de forma a combater o doping em todo o planeta, exortando todas as nações a aderirem às suas recomendações, tendo o Brasil incorporado esse Código à sua legislação.

Entretanto, a observância cega e absolutamente mecânica a essa cartilha vem redundando em inúmeros prejuízos a clubes e atletas, que acabam sendo punidos sem a observância dos requisitos mínimos do contraditório e da ampla defesa, devidamente assegurados pela Constituição.

No caso de Romário, por exemplo, houve a condenação porque a substância encontrada “tem potencialmente o poder de inibir a descoberta, pelo exame, de outra que poderia ter sido utilizada para melhorar o desempenho do atleta”.

Por via de conseqüência, não se sabe se efetivamente Romário fez uso de expedientes ilegais para melhorar a sua performance. Presumiu-se simplesmente que sim, pelo simples fato de ter sido detectada em seu organismo uma substância que poderia adulterar o resultado do exame.

Parte-se, portanto, de um pressuposto que viola o básico principio de direito que é o da presunção de inocência, para, pelo contrário, presumir a culpa do atleta, esquecendo-se da regra capital de que o “ônus da prova incumbe a quem o alega”, ou seja, quem acusa o jogador por doping, deve, pelo menos, provar que ele fez uso de substancia que elevou artificialmente o seu desempenho, pois, caso contrário, a sua punição não faria sentido.

Se não é possível comprovar-se a culpa, a absolvição é uma medida natural que se impõe, já que não podemos esquecer também do rudimentar principio juridico “in dúbio pro reo”, isto é, na dúvida, deve-se absolver e não punir quem está sendo acusado, por ser esta uma garantia fundamental de todo ser humano, não devendo ser esquecido que está em jogo a reputação e a própria carreira profissional de um desportista.

O que se tem observado nas decisões de boa parte dos tribunais desportivos é a automática condenação do jogador, uma vez detectada a presença de uma substancia listada pela WADA, sem que haja a preocupação em se averiguar se ela foi capaz de alterar seu rendimento, ou em identificar a real culpa do atleta ao usar medicamento proibido, como na condenação em primeira instancia de Dodô, o que resulta em deturpar a salutar luta de todos contra a dopagem no esporte.

Algo está errado na forma pela qual estão sendo julgadas estas questões, vez que essas decisões não resistiriam à seguinte pergunta, sobre a qual deve-se meditar: se, para condenar o atleta por doping, basta constatar no seu organismo a presença de alguma substância listada pela WADA, para que serve instaurar um processo no tribunal, apresentar-se defesa, serem produzidas provas e proferir-se uma sentença?