Programa Arena Esportiva discutiu a legislação esportiva
O programa Arena Esportiva desta semana tratou exclusivamente do direito desportivo.
Foram abordados os seguintes temas:
Mudanças na legislação esportiva brasileira;
Limites da autonomia das entidades desportivas;
Governança corporativa de clubes e federações;
O Profut;
A criação do Tribunal único de Doping.
Assista on demand os blocos 1 e 2 do programa que teve a apresentação do Jornalista Rui Guilherme e contou com a participação de Martinho Neves Miranda
Cielo e o Doping: quando punir?
Artigo originalmente publicado no jornow, dia 21 de julho de 2011.
A recente detecção da substância furosemida no organismo do nadador Cesar Cielo e de outros atletas do Clube de Regatas do Flamengo, fizeram surgir na mídia debates sobre se eles devem ou não serem punidos e por quanto tempo.
Só que essas discussões às vezes deixam de lado uma questão fundamental e que antecede todas as demais: Por que se pune alguém por doping?
O doping é o estelionato do esporte. Viola o princípio da igualdade entre os competidores e faz com que o atleta dopado tenha um desempenho artificialmente elevado em relação aos demais. Não raro, altera para sempre as condições de saúde de quem se utiliza dessas substâncias e deturpa o slogan de que “esporte é saúde”. Em suma, o atleta dopado que ganha uma competição não a venceu por ter sido o melhor, mas porque trapaceou.
Portanto, para que um atleta seja punido por doping é necessário que se verifique se a substância ingerida é capaz de gerar um aumento artificial de desempenho ou se, de alguma forma, o desportista tentou burlar o sistema de controle de forma a encobrir a ilegalidade do ato praticado.
No caso detectado em Cielo e nos demais nadadores, a furosemida por si só não aumenta a performance deles e nem de quem quer que seja, mas tem o condão de evitar que a substância ilícita seja detectada no teste antidopagem. Então também se justifica a punição, pois quem se utiliza desse expediente está tentando esconder o fato de ter se dopado.
Mas será que teria sido essa a hipótese? O painel de controle antidopagem da CBDA – Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos – informou que a quantidade de furosemida encontrada era tão pequena que não era capaz de mascarar qualquer outra substância, o que evidencia hipótese clara de inexistência de doping bem como da ausência de intenção de burlar o controle antidopagem.
E esse aspecto traz à baila a triste constatação: boa parte dos tribunais desportivos, uma vez detectada a presença de uma substância proibida, condenam de forma automática um atleta sem averiguar se ela foi capaz de alterar seu rendimento, ou de burlar o controle antidoping
Então, se não aconteceu nenhuma das duas hipóteses, a pergunta que surge é simples e natural: porque punir?
A banalização das punições por doping
Artigo originalmente publicado no Jornal Extra, em Dezembro de 2007. Edição Eletrônica. Blog de Gilmar Ferreira. Galeria de Notáveis.
A recente condenação de Romário a 120 dias de suspensão por uso da substância “finasterida”, coloca em xeque as punições por doping no Brasil e no mundo, merecendo uma profunda reflexão a respeito.
O aumento dos casos de condenação de atletas sob esse fundamento deve-se primordialmente ao fato de ter sido criada a WADA – World Anti-Doping Agency- (Agencia Mundial Anti-Doping), que, a partir de 2003, passou a divulgar anualmente uma lista de substâncias proibidas, de forma a combater o doping em todo o planeta, exortando todas as nações a aderirem às suas recomendações, tendo o Brasil incorporado esse Código à sua legislação.
Entretanto, a observância cega e absolutamente mecânica a essa cartilha vem redundando em inúmeros prejuízos a clubes e atletas, que acabam sendo punidos sem a observância dos requisitos mínimos do contraditório e da ampla defesa, devidamente assegurados pela Constituição.
No caso de Romário, por exemplo, houve a condenação porque a substância encontrada “tem potencialmente o poder de inibir a descoberta, pelo exame, de outra que poderia ter sido utilizada para melhorar o desempenho do atleta”.
Por via de conseqüência, não se sabe se efetivamente Romário fez uso de expedientes ilegais para melhorar a sua performance. Presumiu-se simplesmente que sim, pelo simples fato de ter sido detectada em seu organismo uma substância que poderia adulterar o resultado do exame.
Parte-se, portanto, de um pressuposto que viola o básico principio de direito que é o da presunção de inocência, para, pelo contrário, presumir a culpa do atleta, esquecendo-se da regra capital de que o “ônus da prova incumbe a quem o alega”, ou seja, quem acusa o jogador por doping, deve, pelo menos, provar que ele fez uso de substancia que elevou artificialmente o seu desempenho, pois, caso contrário, a sua punição não faria sentido.
Se não é possível comprovar-se a culpa, a absolvição é uma medida natural que se impõe, já que não podemos esquecer também do rudimentar principio juridico “in dúbio pro reo”, isto é, na dúvida, deve-se absolver e não punir quem está sendo acusado, por ser esta uma garantia fundamental de todo ser humano, não devendo ser esquecido que está em jogo a reputação e a própria carreira profissional de um desportista.
O que se tem observado nas decisões de boa parte dos tribunais desportivos é a automática condenação do jogador, uma vez detectada a presença de uma substancia listada pela WADA, sem que haja a preocupação em se averiguar se ela foi capaz de alterar seu rendimento, ou em identificar a real culpa do atleta ao usar medicamento proibido, como na condenação em primeira instancia de Dodô, o que resulta em deturpar a salutar luta de todos contra a dopagem no esporte.
Algo está errado na forma pela qual estão sendo julgadas estas questões, vez que essas decisões não resistiriam à seguinte pergunta, sobre a qual deve-se meditar: se, para condenar o atleta por doping, basta constatar no seu organismo a presença de alguma substância listada pela WADA, para que serve instaurar um processo no tribunal, apresentar-se defesa, serem produzidas provas e proferir-se uma sentença?